Um dia lá está você saindo da escola, usando uma mochila
pesada e com onze anos de vivência. Você larga
um olhar de soslaio para um cara que passa ao teu lado com uma camiseta verde e
um boné bege. Então, olha mais detalhadamente e percebe que aquela face magra
não é estranha.
Descobrem que são vizinhos e aproximam-se de
um modo súbito. Ele te faz ouvir rock pesado e falar sobre coisas não muito
convencionais. Manda-te músicas do Silverchair, te procura e te interroga. Cala-se
por um tempo. Evapora. E volta. Diz pra você ouvir Slipknot, não acreditar em
Deus e fala que gosta dos teus papos psicóticos. Chama-te de criança, mesmo
sendo somente cinco anos mais velho. Outro dia, te diz coisas bonitas, arruma
as malas em silêncio e parte.
Você
vai para o ensino médio, larga o restinho da doce inocência infantil que
restava. Enquanto ele ingressa em uma faculdade, e começa a viver seu mundinho
paralelo entre números e negócios. Você descobre os livros, assim como os
portugueses descobriram um novo
mundo, expandindo horizontes. Você passa a escrever. E um dia surge um crítico
para sua escrita leiga: ele.
O tempo como um novelo de lã, vai se
desenrolando. O tique-taque do relógio fica mais forte. E numa manhã escaldante
de um sábado de fevereiro, ele te liga dizendo que está na cidade e que
gostaria de trocar umas ideias enquanto tomam um sorvete. Você dispensa o convite e é soterrada pelas
velhas expectativas. Até hoje não sabe sobre aquelas ideias, que com certeza
deveriam ser muito mirabolantes e nada reais. Porque naquela época você não era
tão utópica, apenas ansiava algo que enraizasse no chão, pois a fantasia que
precisava encontrava em Crepúsculo.
Os
anos passam, os sentimentos diminuem. Vocês crescem. E descobrem-se como placas tectônicas
divergentes. Afastam-se cada vez mais. Por fim, descobrem que a vida não é cínica.
O cinismo é desempenhado pelos atores desse espetáculo, que esnobaram as
oportunidades, não interpretaram as cenas idealizadas, sendo responsáveis
também pela decupagem falha de um grande filme.
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